O PROBLEMA DA PRÁTICA COMO UM PONTO DE PARTIDA PARA A FORMAÇÃO PARA O TRABALHO EDUCATIVO TRABALHO EDUCATIVO– Aula 02
- Elza Peixoto
- 17 de abr.
- 7 min de leitura
– a concepção predominante na literatura própria da área da educação, particularmente, entre os que reivindicam o materialismo dialético como referência –
Introdução – o problema como uma necessidade objetiva assumida subjetivamente:
Estando este curso no âmbito de um PPG em educação, a direção da identificação de um problema remete-se, simultaneamente, (a) à nossa conexão ontológica com o objeto de nossas necessidades de investigação e (b) ao nosso esforço gnosiológico de compreendê-lo e simultaneamente apresentar uma abordagem que possibilite saltos em sua compreensão que viabilizem a precisão de nossas ações coletivas e organizadas em direção ao movimento prático naquele sentido dado por Marx e Engels de transformação material das realidades[1]. Para nós, particularmente, saltos no âmbito da formação de professores para a prática no seio das políticas de trabalho e educação que se movem na formação social brasileira em íntima conexão com a divisão internacional do trabalho em relações produção capitalistas[2] hoje dirigidas pelos princípios de economia política ultraliberais.
Sob esta perspectiva, um estudo teórico[3] que toma a prática por objeto, sob uma perspectiva materialista e dialética orientada pelas formulações de Marx e Engels, exige, simultaneamente, (a) o reconhecimento da concepção de prática que tem predominado na produção teórica e nas diretrizes da formação de professores em disputa na formação social brasileira; (b) a crítica teórica rigorosa da concepção de prática que predomina nestas proposições; (c) em relação com o esforço de reconhecer as formulações onto-gnosiológicas do materialismo dialético proposto originalmente por Marx e Engels, a partir da preciosa síntese elaborada no conjunto da obra de José Barata-Moura, que identifica idealismos onde reivindica-se o materialismo dialético. Qual a natureza deste idealismo anotado por Barata-Moura é o que vamos procurar ao longo deste curso.
Na aula de hoje, o nosso ponto de partida é a obra “Para a crítica dos fundamentos da formação de professores: o problema da prática” (PEIXOTO, 2021), especialmente, no aspecto do balanço das concepção de prática que estão dirigindo as disputas pela formação de professores na formação social brasileira, expressas e delimitadas (I) nas diretrizes curriculares e nas (II) formulações críticas que reivindicam o materialismo dialético como matriz teórica (SAVIANI, Helena de Freitas, Luiz Carlos de Freitas, Coletivo de Autores). Uma primeira abordagem deste balanço foi efetuada na obra referida (PEIXOTO, 2021) e deve ser continuada aqui nesta retomada que fazemos hoje.
Comecemos, portanto, na página 27 (PEIXOTO, 2021), quando analisando as teses e dissertações produzidas por um grupo de pesquisas que reivindica o materialismo dialético como referência, constatamos a ausência” de uma “incursão teórica mais aprofundada sobre a perspectiva da prática para a Concepção Materialista e Dialética [...] nas teses analisadas” [ler juntos];
Acompanhemos o processo da problematização que vai perguntando sobre a conceção de prática presente nestas tese e dissertações e constatando que ali imperam a concepção de prática como: “(1) “real”; (2) o constatável na realidade insatisfatória; (3) fazer enquanto experiência reveladora, individual e pessoal; (4) fazer próprio e diferenciado do docente; (5) campo de ação marcado por condições legadas pelo passado; (6) atividade transformadora material; (7) colocar em ação, mover ou transformar a realidade histórica; (8) ação esclarecida e orientada; (9) trabalho como condição de produção do conhecimento; (10) “categoria ontológica humana”; (11) predicado do homem; (12) ação alienada a ser transformada; (13) trabalho; e (14) uma ação que se faz no seio das relações sociais e contém estas relações sociais” (PEIXOTO, 2023, p. 27). Observe-se aqui que em Dissertações e Teses produzidas por coletivos que reivindicam o materialismo dialético, encontramos polissemia, e uma abordagem sincrética na abordagem do problema da prática, quando, em perspectiva materialista dialética rigorosa, já encontramos referências que possibilitam promover uma visão sintética (e aqui, a título de exemplo, destacamos que as obras de Barata-Moura foram produzidas nos anos 80 do século XX).
No âmbito da crítica ao estágio de desenvolvimento destas diretrizes, destacam-se a defesa de posições sobre o que seria uma abordagem materialista e dialética do problema da prática a serviço de uma formação dos professores para a luta de classes (FREITAS, “O trabalho como princípio articulador na prática de ensino e nos estágios”. Campinas: Papirus, 1996; ANFOPE; FREITAS, L. C.; SAVIANI; DIAS – conforme citados por PEIXOTO, 2021, p. 32-51). O estudo deste conjunto de críticas possibilitou algumas sínteses que consideramos importante revisar:
(1) fundamentar de forma idealista a defesa da prática do ensino na formação dos professores de Educação Física no Brasil;
(2) delimitar de forma idealista a realidade das relações interpessoais entre professores supervisores de campo/professores efetivos de campo/estudantes em formação/estagiários nos nexos com a posição de classe dos professores e das crianças e jovens/estudantes em cada comunidade da escola pública ignorando a luta de classes em que se inscreve esta relação;
(3) delimitar de forma idealista a realidade da relação professores supervisores de campo/professores efetivos de campo/estudantes em formação/estagiários/crianças e jovens em formação com os espaços de fluxo Universidade/Escola/Bairro/Cidade/Estado/Região ignorando as disputas em torno do espaço geográfico e sem problematizar com rigor e radicalidade a situação das periferias;
(4) delimitar de forma idealista a realidade da atividade dos professores no âmbito da relação professores supervisores de campo/professores efetivos de campo/estudantes em formação/estagiários/crianças e jovens em formação com os espaços de fluxo Universidade/Escola/ Bairro/Cidade/Estado/Região ignorando os conflitos interno a esta atividade em todos os níveis;
(5) delimitar de forma idealista o conhecimento a ser selecionado e transmitido na relação professores supervisores de campo/professores efetivos de campo/estudantes em formação/estagiários/crianças e jovens em formação ignorando-se as relações de produção capitalistas e os interesses de classe dos estudantes e professores;
(6) delimitar de forma idealista – ou mesmo não considerar – as políticas educacionais que efetivamente são implantadas, desconhecendo-se a realidade das condições de trabalho e condições de formação que entra em movimento na relação professores supervisores de campo/ professores efetivos de campo/estudantes em formação/estagiários/ crianças e jovens em formação com os espaços de fluxo Universidade/ Escola/Bairro/Cidade/Estado/Região.
Esta constatação nos levou a reconhecer a necessidade de uma rigorosa revisão do tema da prática, de modo a ver bem no aspecto dos fundamentos filosóficos, as possibilidades e os limites do projeto de formação de professores que constitui o caminho pelo qual temos nos guiado. (PEIXOTO, 2021, p. 50 e 51).
Na análise dos textos que são referência para o curso de Licenciatura em Educação Física da FACED, avançamos para análises que, ainda em caráter muito rudimentar, evidenciam a construção categorial que vai sendo elaborada pelos autores do campo da educação, marcada por polissemia e paráfrase. A título de exemplos, citamos análise de PEIXOTO (2021: p. 133-155; p. 170-187; p. 190 – 207) sobre a diversidade de processos em que a elaboração sobre a prática se encaminha em obras que reivindicam a mesma matriz teórica.
É muito curioso que a ênfase na prática como o ponto de partida – uma reivindicação frequente no âmbito das proposições que reivindicam o materialismo dialético – uma preocupação evidente e constante em todos os três textos analisados na obra de Peixoto (2021, p. 133-207), tem na raiz uma mesma matriz original: “As Teses sobre Feuerbach”!
É, pois, este o nosso ponto de partida neste curso: As teses sobre Feuerbach de Marx, que nos serão apresentadas por José Barata-Moura. O nosso objetivo nesta fase do curso é apanhar nas notas originais de Marx e Engels os rudimentos de base do materialismo dialético que vão amadurecendo em direção “A ideologia alemã”. Por esta razão, visando compreender os fundamentos do materialismo que subjazem a concepção de prática na obra de Marx e Engels, realizaremos o seguinte caminho/cronograma para as nossas próximas aulas:
10/04 – Aproximação mais geral ao problema da prática na formação social brasileira;
17/04 – Estudo das Tese sobre Feuerbach (de forma mais geral) e de “A ideologia alemã”;
24/04 – Concepção materialista de materialismo e idealismo;
Maio a junho – leitura das obras de Barata-Moura em crítica das “Ontologias da Práxis”. Qual o eixo desta crítica?
[1] “As revoluções precisam de um elemento passivo, de uma base material. A teoria só se realiza num povo na medida em que é a realização das suas necessidades. [...] Serão as necessidades teóricas diretamente necessidades práticas? Não basta que o pensamento procure realizar-se; a realidade deve igualmente compelir o pensamento”. [...] Uma revolução radical só pode ser a revolução de necessidades reais [...]”. A possibilidade positiva da emancipação exige a “[...] formação de uma classe que tenha cadeias radicais, de uma classe na sociedade civil que não seja uma classe da sociedade civil, de um estamento que seja a dissolução de todos os estamentos, de uma esfera que possua caráter universal porque os seus sofrimentos são universais e que não exige uma reparação particular porque o mal que lhe é feito não é um mal particular, mas o mal em geral, que já não possa exigir um título histórico, mas apenas o título humano; de uma esfera que não se oponha a consequências particulares, mas que se oponha totalmente aos pressupostos do sistema político alemão; por fim, de uma esfera que não pode emancipar-se a si mesma nem se emancipar de todas as outras esferas da sociedade sem emancipa-las a todas – o que é, em suma, a perda total da humanidade, portanto, só pode redimir-se a se mesma por uma redenção total do homem. A dissolução da sociedade como classe particular, é o proletariado”. [...] o proletariado é o coração da emancipação da humanidade. (MARX, Crítica da filosofia do direito de Hegel, Boitempo, 2005, p. 152-156).
[2] Aqui, mais uma vez, retomamos o materialismo dialético de Marx em movimento em “O Capital”: “No conjunto formado pelos valores de uso diferentes ou pelas mercadorias materialmente distintas, manifesta-se um conjunto correspondente dos trabalhos úteis diversos – classificáveis por ordem, gênero, espécie, subespécie, e variedade -, a divisão social do trabalho. Ela é a condição para que exista a produção de mercadorias [...].
[...] o valor de uso de cada mercadoria representa determinada atividade produtiva subordinada a um fim, isto é, um trabalho útil particular. Valores de uso não podem se opor como mercadorias quando neles não estão inseridos trabalhos úteis qualitativamente distintos. Numa sociedade cujos produtos assumem, geralmente, a forma de mercadorias – isto é, numa sociedade de produtores de mercadorias -, essa diferença qualitativa dos trabalhos úteis executados, independentes uns dos outros, como negócio particular de produtos autônomos, leva a que se desenvolva um sistema complexo, uma divisão social do trabalho” (MARX, O Capital. Civilização Brasileira, 2008, p. 64). É esta condição própria das relações de produção capitalistas que torna o trabalho dos professores uma mercadoria útil – na divisão social do trabalho – às relações de produção capitalistas, ocorram estas nas redes pública ou privada que constituem o complexo sistema nacional de educação próprio da formação social brasileira, cuja finalidade precípua nas relações de produção capitalistas é a produção da força de trabalho como peça da engrenagem das relações de produção capitalistas, cuja qualificação (valor de uso) precisa estar adequada à posição que esta peça trabalhador ocupa nesta engrenagem. Sobre isto começo a tratar no artigo (PEIXOTO, 2023)
PEIXOTO, E. M. DE M. CONCENTRAÇÃO DE FORÇAS PRODUTIVAS, LUTA DE CLASSES E IMPOSSIBILIDADE DE UM “SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO” UNITÁRIO. Revista Trabalho Necessário, v. 21, n. 44, p. 01-24, 13 abr. 2023. Disponível em: https://periodicos.uff.br/trabalhonecessario/article/view/56127)
PEIXOTO, E. M. de M. PARA A CRÍTICA DOS FUNDAMENTOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES: o problema da prática. Goiânia: Edições Gárgula/Editora Kelps, 2021.
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