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Blog Crítica Prática

MARXISMO, TEORIA DO CONHECIMENTO E EDUCAÇÃO - 3a Edição

SOBRE A NECESSIDADE RADICAL DE

RECONHECER O MARXISMO COMO TEORIA DO CONHECIMENTO E DE AÇÃO.


AULA INAUGURAL - 14.03.2015


O meu objetivo nesta aula inaugural é expor e explicar (a) a necessidade que determina que tenhamos no PPGE FACED/UFBA – e eu diria, em qualquer PPG de qualquer área – uma disciplina que trata de Marxismo, Teoria do Conhecimento e Educação, assim como, (b) situar a tradição a qual esta disciplina se remete e vincula, exercício fundamental para apreender e por em questão – portanto em constante crítica – as determinantes do modo como ela será conduzida, em uma realidade em constante movimento e mudança.


Esta disciplina, tal como sinaliza sua ementa, visa o


Estudo cronológico da obra de Marx e Engels com o fim de apreender, na crítica à ciência burguesa, o processo de elaboração da concepção materialista e dialética da história, destacando-se especialmente (a) as origens e as fontes do marxismo, e, no debate do tempo histórico, (b) o posicionamento ontológico, gnosiológico, axiológico e teleológico assumido pelos autores.


Nela, temos que investigar (1) as condições históricas em que são produzidos os pressupostos que orientam a Concepção Materialista e Dialética da História como teoria sobre a possibilidade do conhecimento, intervenção e transformação da realidade, na qual, os homens “fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado” (MARX, O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, 1852), e (2) estes mesmos pressupostos de acordo com a tradição a que se remetem e com a qual conversam em movimento de superação.


Com ousadia interpretativa, podemos dizer que nestes tempos de “crise revolucionária”, em que os homens estão “empenhados em revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu”, justamente nestes tempos, “os homens conjuram ansiosamente em seu auxílio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentar-se nesta linguagem emprestada”. Mas, é apenas quando puderem manejar, “sem apelar para (as vozes do) o passado”, o movimento da história, que os homens terão apreendido os “espírito” da história e poderão “produzir livremente nela”.


Em busca desta possibilidade de ação orientada à finalidade de produzir uma nova realidade, urge que apliquemos ao estudo do marxismo o método marxiano e engelsiano de conhecer aquilo que é para conhecer aquilo que pode vir a ser, permitindo-nos dominar o marxismo como instrumento revolucionário de orientação do agir sobre este vir a ser, moldando-o conforme as necessidades revolucionárias. Trata-se, finalmente, da meta de uma ação revolucionária, um trabalho revolucionário que tem como característica figurar “na mente sua construção antes de transformá-la em realidade” (MARX, Processo de trabalho e processo de produzir mais valia, O capital, 1867), o que demanda um profundo domínio sobre aquilo que é a realidade e sobre as leis do seu movimento de modo a apanhar o que ela pode vir a ser. Só ai, estamos prontos para “produzir livremente nela”. Para isto – defendo – é necessário parar de repetir os bordões dos marxismos (conjurar os espíritos do passado), e passar a trabalhar para (a) conhecendo o cerne da teoria, a partir do seu uso, (b) conhecer aquilo que é a realidade e (c) intervindo naquilo que ela pode vir a ser, (d) direcioná-la de acordo com as demandas da classe trabalhadora em direção à revolução do modo capitalista de produção da existência.


Quando Marx nos diz em 18 de Brumário de Luís Bonaparte (1852) que os homens “fazem sua própria história”, mas “não a fazem como querem”, mas a “fazem sob circunstâncias” com as quais se defrontam, que lhe foram “legadas e transmitidas pelo passado”, pelos homens do passado, pela história que os homens do passado fizeram, está nos dizendo que os homens “fazem sua própria história”, mas não a podem dirigir como querem (de acordo com o que lhes passa pelas ideias com o que abstraem). Para fazer a história produzindo-a livremente, os homens precisam conhecer as determinações da realidade – tudo aquilo que faz a realidade ser aquilo que é – o seu movimento. Os homens precisam conhecer os meios para conhecer e intervir nesta realidade construindo a potencialidade real de modifica-la Só o conhecimento das determinações de aquilo que é esta realidade apanhada em seu movimento e mudança, pode permitir apanhar tendências sobre as quais os homens finalmente operam, praticamente, uma transformação material orientada por finalidades conscientemente construídas.


Sobre o desafio de conhecer aquilo que é a Concepção Materialista e Dialética da História


A Concepção Materialista e Dialética da História é a teoria científica que suporta o projeto revolucionário do proletariado (ENGELS, Do socialismo utópico ao socialismo científico, 1880) que emerge como classe em si e para si do seio das relações de produção que desenvolvem-se na transição da sociedade feudal para a sociedade capitalista promovida pela revolução burguesa (MARX e ENGELS, Manifesto do Partido Comunista, 1848). É a teoria que é conscientemente formulada com o fim de conhecer, intervir e transformar, ou seja, de fazer a história a partir de uma prática orientada pelas determinações da realidade. A questão central é, pois, investigar o caminho para apreender com verdade as determinações desta realidade. Estão na raiz da Concepção Materialista e Dialética da História o posicionamento frente às questões fundamentais da filosofia e da teoria do conhecimento, que versam sobre a possibilidade de conhecer e produzir ou por a realidade. O caminho que percorrem para responder a esta necessidade vital está marcado pelo (a) estudo do desenvolvimento das condições históricas em que os problemas surgem e podem ser solucionados, (b) a busca pela determinação primeira sobre a qual assenta-se a possibilidade de conhecer e produzir ou por a realidade.


É em um complexo movimento histórico de (a) defrontar-se com a necessidade histórica de criticar tudo aquilo que há, a serviço das lutas dos homens reais, a serviço dos Miseráveis[1] (ENGELS, A condição da Classe Trabalhadora na Inglaterra, 1845), que se coloca a necessidade de (b) dominar este debate sobre a possibilidade do conhecimento, intervenção e transformação da realidade (cujo acúmulo já nos anos 1840 era impressionante). É este movimento que permite que a Concepção Materialista e Dialética da História desenvolva-se como teoria sobre a possibilidade do conhecimento, intervenção e transformação da realidade que pela primeira vez apanha em profundidade aquilo que é a verdade da realidade. Está no centro do debate filosófico a definição de aquilo que é o real (em contraposição às quimeras), e a descoberta do caminho para apreender este real com verdade. É no aprofundamento do Idealismo Alemão, da Economia Política Inglesa, do Socialismo Utópico Francês, e na inserção na luta de classes em movimento na Europa do século XIX, é na análise minuciosa do estágio de desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção da Inglaterra do século XIX que vai evidenciando-se para Marx e Engels o caminho para conhecer e intervir na realidade a partir das determinações da própria realidade.


É assim, que Marx dirá, em 25 de julho de 1867, no Prefácio de O capital: “Nesta obra, o que tenho de pesquisar é o modo de produção capitalista e as correspondentes relações de produção e de circulação”, destacando “[...] não é o maior ou menor grau de desenvolvimento dos antagonismos sociais oriundos das leis naturais da produção capitalista, mas estas leis naturais, estas tendências que operam e se impõem com férrea necessidade”. Demarca: “o objetivo final desta obra é descobrir a lei econômica do movimento da sociedade moderna” (MARX, Prefácio da 1a Edição, O Capital, 1867). A passagem exata é:


Não nos apeguemos às ilusões. Conseqüências, na Europa, da Guerra da Independência Americana do século XVIII e da Guerra Civil Americana do século XIX: a primeira fez soar o toque de alerta para a classe média; a segunda, o toque de alerta para a classe trabalhadora. Na Inglaterra, é palpável o processo revolucionário. Depois de alcançar certo nível, terá de repercutir sobre o Continente. Aí assumirá ele formas mais brutais ou mais humanas, conforme o grau de desenvolvimento da classe trabalhadora. Pondo de lado motivos de índole nobre, o interesse mais egoísta impõe às classes dominantes que eliminem todos os obstáculos legalmente removíveis, que estorvam o progresso da classe trabalhadora. Por esta razão, além de outras, tratei, extensamente, neste volume, da história, do conteúdo e dos resultados da legislação fabril inglesa. Uma nação deve e pode aprender de outra. Ainda quando uma sociedade tenha desvendado o significado da lei natural que rege seu movimento – e o objetivo final desta obra é descobrir a lei econômica do movimento da sociedade moderna, – não pode ela suprimir, por saltos ou por decreto, as fases naturais do seu desenvolvimento. Mas, ela pode encurtar e reduzir as dores do parto (MARX, Prefácio da 1a Edição, O Capital, 1867).


É aqui que mais uma vez aparece a tese: “os homens fazem sua história”, não como querem, mas sob circunstâncias que lhe são legadas pelo passado. É por isso que a concepção de Marx e de Engels “do desenvolvimento da formação econômico-social como um processo histórico-natural exclui, mais do que qualquer outra, a responsabilidade do indivíduo por relações, das quais ele continua sendo, socialmente, criatura, por mais que, subjetivamente, se julgue acima delas” (MARX, Prefácio da 1a Edição, O Capital, 1867). Sob estas condições, há liberdade? Sob a determinação de que fazemos história sob condições históricas determinadas, há possibilidade de liberdade? De criação? De invenção de um outro futuro?? Sim. Mas um novo futuro tem sempre que ser construído com os pés no chão. Há movimento e mudança, mas determinado pelo existente:


A concepção materialista e dialética da história parte da tese de que a produção, e com ela a troca dos produtos, é a base de toda a ordem social; de que em todas as sociedades que desfilam pela história, a distribuição dos produtos. E juntamente com ela a divisão social dos homens em classes ou camadas, é determinada pelo que a sociedade produz e e como produz e pelo modo de trocar os seus produtos. De conformidade com isso, as causas profundas de todas as transformações sociais e de todas as revoluções políticas não devem ser procuradas nas cabeças dos homens nem na ideia que eles façam da verdade eterna ou da eterna justiça, mas nas transformações operadas no modo de produção e de troca; devem ser procuradas não na filosofia, mas na economia da época de que se trata. Quando nasce nos homens a consciência de que as instituições sociais vigentes são irracionais e injustas, de que a razão se converteu em insensatez e a bênção em praga, isso não é mais que um indício de que nos métodos de produção a nas formas de distribuição produziram-se transformações com as quais já não concorda a ordem social, talhada segundo o padrão de condições econômicas anteriores. E assim já está dito que nas novas relações de produção têm forçosamente que conter-se – mais ou menos desenvolvido – os meios necessários para por fim aos males descobertos. E esses meios não devem ser tirados da cabeça de ninguém, mas a cabeça é que tem que descobri-los nos fatos materiais da produção, tal e qual a realidade os oferece (ENGELS, Do socialismo utópico ao socialismo científico, s/d, p. 49).


Faremos juntos o esforço de apanhar o processo histórico de produção da Concepção Materialista e Dialética da História, a partir da leitura das obras dos seus fundadores. Principalmente, devemos concentrar-nos no estudo do modo como – em determinado estágio de desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção, apanhando o movimento desta conjuntura – dois pensadores e militantes revolucionários vão posicionar-se, a partir de necessidades históricas muito objetivas, frente aos problemas fundamentais da filosofia – que tratam da possibilidade de o homem conhecer e governar a direção do movimento do mundo – para trazê-la de volta às necessidades terrenas.


A necessidade radical que me move a oferecer esta disciplina é, na conjuntura em que os homens conjuram os espíritos do passando, repetindo-os como farsa, retomar o caminho no qual Marx e Engels vão apropriar, criticar e superar o idealismo filosófico alemão, a economia política inglesa, o socialismo utópico francês, propondo a Concepção Materialista e Dialética da História como instrumento revolucionário de produção de uma ação orientada à finalidade de superação do capitalismo. Isto implica reconhecer as circunstâncias históricas que determinaram e possibilitaram a ação de Marx e Engels, considerando o próprio caminho que eles conceberam, apanhando o estágio de desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção no século XIX. Não se trata de idolatrar ou de converter suas concepções em dogmas a serem repetidos ad infinitum. Mas de apreender o caminho que indicaram – de conjunto – para reconhecer o caminho para fazer a história com o pleno conhecimento das possibilidades que nos são legadas pelo passado. Trata-se de exercício de apreender e pensar a teoria.


Estava claro para ambos que o estágio de desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção no século XIX determinava a possibilidade de superação da profunda exploração em que vivia o proletariado. Dedicados à causa da superação do capitalismo, Marx e Engels impunham-se a tarefa de apreender o movimento do real para auxiliar no processo de sua transformação. Sob estas condições, Marx investiga as “formações econômicas pré-capitalistas”, analisa “a chamada acumulação primitiva”, a “maquinaria e a indústria moderna”, acompanha junto com Engels as relações de produção da Europa e na América do Norte. Com Engels, Marx sistematiza a Concepção Materialista e Dialética da História enquanto teoria sobre as possibilidades e os limites da ação humana em uma dada conjuntura. Mas, qual ontologia? Qual gnosiologia orienta a produção desta teoria revolucionária?


Prática, trabalho e modo de produção


Os homens fazem a história. Mas, em quais condições??? Os homens põem o mundo, mas o fazem determinados pelas propriedades objetivas de um mundo objetivo, incluindo as propriedades objetivas do próprio homem.


Nos anos 40, e, em especial, entre 1845 e 1846, este movimento de apropriação crítica do idealismo filosófico alemão (Kant, Hegel, Jovens hegelianos e Feuerbach), da economia política inglesa (Ricardo, Say), do socialismo utópico francês (entre outros Proudhom) se da de forma mais intensa em obras como Esboço de uma crítica da economia política (Engels, 1844), Crítica da filosofia do direito de Hegel (Marx, 1843), A questão judaica (Marx, 1844), Crítica da filosofia do direito de Hegel: introdução (Marx, 1844), Manuscritos econômico-filosóficos (Marx, 1844), A condição da classe trabalhadora na Inglaterra (Engels, 1845), A sagrada família (Marx e Engels, 1845), Teses sobre Feuerbach (1845), A ideologia alemã (1845-1846), Miséria da filosofia (Marx, 1847), Princípios do Comunismo (Engels, 1847) e Manifesto do Partido Comunista (Marx e Engels, 1848). Estes textos associados à correspondência dos dois autores, evidenciam que entre 1844 e 1848, são elaborados os supostos da Concepção Materialista e Dialética da História, que explicam aquilo que é o homem em perspectiva materialista e dialética, afirmando com convicção: sim, o homem pode conhecer e intervir na realidade imprimindo-lhe forma humana, histórica. Mas este fazer a história ocorre determinado. Trata-se de, justamente, reconhecer quais são estas determinações, e, nelas, as potencialidades e limites da ação humana.


No movimento investigativo que vamos fazer juntos, espero, progressivamente, no estudo dos textos dos dois autores, vamos apanhar a centralidade da atividade vital – o trabalho – na ontologia humana, apanhada não na perspectiva burguesa de uma atividade individual e singular, sem passado (robinsonada), mas na perspectiva materialista e dialética de uma ação que marca a espécie e a faz possuir uma especificidade sem a qual não é possível aprender a natureza histórica da sua atividade: a produção da existência, na relação primeira com a natureza e com os outros homens, possibilita o desenvolvimento progressivo de forças produtivas e relações de produção que sucedem-se evolutivamente determinadas pelas condições geográficas (a terra), as forças produtivas (o estágio das ferramentas que o homem interpõe entre si e a natureza) e as relações de produção (as relações que os homens estabelecem entre si e com a natureza, que permitem o acesso total ou parcial as condições de produção em um determinado momento histórico). É neste contexto que encontramos o fundamento para o entendimento de trabalho, prática e produção da existência que os dois autores vão desenvolver.


Apontamentos sobre as referências centrais e a tradição a que se remetem:


Marxismo, teoria do conhecimento e educação decorre da necessidade de estudar o marxismo para apreender o método mais avançado para a análise e explicação das condições objetivas nas quais se desenvolve o trabalho pedagógico na escola que o capitalismo desenvolve como instituição que cumpre a tarefa de concretizar o projeto histórico da classe dominante, a classe capitalista, para a classe trabalhadora. Estudamos a Concepção Materialista e Dialética da História para compreender a luta de classes em que é travada a disputa de projetos pela direção da formação da classe trabalhadora, em que se confrontam o projeto dos proprietários dos meios de produção e o projeto dos proprietários da força de trabalho. Esta disputa de projetos se faz em uma hegemonia que tem como eixo central a negação à classe trabalhadora do conhecimento necessário para o reconhecimento das condições objetivas em que os trabalhadores vivem, com ênfase em todas as formas de obscurecimento de sua consciência, alcançando o extremo da retomada do pensamento mítico e do irracionalismo como eixos explicativos do mundo, propagada por autoridades no interior das escolas e das Universidades e facilmente reconhecíveis nos corredores desta FACED. A hipótese que orienta o modo como conduzimos esta disciplina é que a realidade está evidenciando os limites do capitalismo, mas a burguesia permanece a classe dominante que controla as ideias hegemônicas, as ideologias dominantes, cumprindo papel anti-revolucionário profundamente associado aos interesses do capital, impossibilitando que reconheçamos, a partir dos recursos intelectuais mais avançados desenvolvidos pela humanidade, as condições objetivas e as demandas urgentes por uma ação teleologicamente orientada para a finalidade da superação do capitalismo. O capital trabalha para a degradação da formação da classe trabalhadora por que sabe que é ela o antagônico que pode impor barreiras à apropriação privada, à concentração da riqueza e à degradação da vida que o capitalismo promove, superando o capitalismo como modo de produção da vida. O capital trabalha para impedir que a classe trabalhadora possa projetar e planificar o seu futuro.


O que nos permite reconhecer este projeto? Definitivamente, não é empirismo e o eterno experimentalismo. Os saltos dados pela humanidade dependeram essencialmente da capacidade de registrar e transmitir as descobertas anteriormente desenvolvidas pelas gerações anteriores. Por esta razão, estamos defendendo a revisão bibliográfica, a apropriação do que já é conhecido, como passo essencial para a superação dos limites do conhecido e a conquista de entendimento mais atual e avançado sobre a realidade.


Neste sentido, cabe aqui uma nota sobre o conjunto das obras que permitiram formular as teses que estamos desenvolvendo nesta disciplina, que não podemos apropriar no seu decorrer, mas que devem ficar registradas como desafios para o aprofundamento dos seus estudos. Este conjunto de obras compõe o quadro que deve ser apropriado para explicar a teoria do conhecimento marxista.


Há um conjunto de referências para o reconhecimento da tradição a que o marxismo se remete e para a explicação do modo como o marxismo se constitui como teoria do conhecimento. Um conjunto de obras que situaram Marx e Engels nos embates do século XIX são cruciais para explicar como a teoria marxista vai se desenvolver. Nós estamos adotando nesta disciplina aquelas escritas pelos próprios Marx e Engels, mas há um conjunto de outras obras de referência que é preciso apropriar, como, por exemplo, (a) as obras que explicam as fontes que Marx e Engels apropriaram e superaram para a produção do marxismo (As três fontes e as três partes constitutivas do marxismo, de Lenin; a Introdução de Florestan Fernandes à obra Marx e Engels: História); (b) as obras que completam o estudo do debate de Marx e Engels com os novos hegelianos e a superação do Idealismo (Fenomenologia do Espírito, de Hegel; A essência do cristianismo, de Feuerbach; Crítica da filosofia do direito de Hegel, de Marx; A sagrada família, de Marx e Engels; A miséria da filosofia, de Marx); (c) as obras que tratam da Concepção Materialista e Dialética da História como estudo do desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção (Origem da família, da propriedade privada e do Estado, de Engels; Grundrisse, de Marx; O Capital, de Marx); (d) as obras que aprofundam a compreensão das relações de produção próprias do capitalismo e dos seus impactos sobre a situação de vida da classe trabalhadora e sua capacidade de se organizar para fazer a revolução sobre o capitalismo (Salário, preço e lucro, de Marx; O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, de Marx; A guerra civil em França, de Engels; Sobre a Alemanha, de Engels; A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de Engels); (e) as obras que contribuem para explicar a centralidade do trabalho na produção da existência humana, a forma do trabalho no capitalismo, e que auxiliam no entendimento da ontologia marxiana e engelsiana (O papel do trabalho na transformação do macaco em homem, e especialmente, os capítulos A mercadoria e Processo de Trabalho e Processo de produzir mais valia, de Marx). Estas obras são referências centrais para a compreensão da força revolucionária da concepção materialista e dialética da história.


É necessário recordar que a concepção materialista e dialética da história originada com Marx e Engels desdobra-se na apropriação e desenvolvimento de sua obra feita por gerações de intelectuais espalhadas em diversos países. É possível revisar a História do Marxismo na coleção de 12 volumes organizada por Erick Hobsbawm, e a História do Marxismo no Brasil, na coleção de 6 volumes organizada por João Quartim de Moraes, Marcos Del Roio, Daniel Aarão Reis Filho e Marcelo Ridenti. Uma exposição sobre este desenvolvimento do marxismo ociental, cujos autores circulam com maior força no Brasil, pode ser obtida na obra Considerações sobre o marxismo ocidental, de Perry Anderson. É imprescindível contar com o Dicionário do pensamento marxista de Tom Bottomore para introduzir-se nos conceitos centrais e localizar as obras centrais para o estudo dos diversos temas e problemas que o marxismo suscita e permite debater.


Interessa-nos, em especial, um conjunto de obras que possibilitam compreender o modo particular como o marxismo vai desenvolver uma teoria do conhecimento, explicar a produção das teorias do conhecimento e explicar os embates de projetos que determinam o acesso à educação, enquanto uma teoria geral da disputa de projetos pela formação humana e enquanto uma história desta disputa de projetos que se dá de modo muito particular na formação social brasileira. Aqui, consideramos particularmente, as obras: Educação e Luta de Classes, de Aníbal Ponce; O imperialismo, fase superior do capitalismo, de Lenin; A era dos extremos, de Erick Hobsbawm; Trabalho e capital monopolista, de Harry Braverman; História da indústria e do trabalho no Brasil, de Francisco Foot Hardman e Victor Leonardi; História das ideias pedagógicas no Brasil, de Dermeval Saviani; Para compreender a ciência: uma perspectiva histórica, de Maria Amália Andery, em especial, a Introdução e o capítulo 22 que trata do entendimento de Marx e Engels sobre o processo de desenvolvimento da ciência. Este conjunto de obras permite compreender os profundos nexos indissociáveis que existem entre modo de produção, trabalho, tempo livre, produção do conhecimento e educação.


Por fim, não poderia propor e conduzir esta disciplina se não tivesse passado pela orientação dos professores José Claudinei Lombardi e José Adriano Barata Moura, responsáveis pela indicação do caminho que me fez chegar a tudo o que sei sobre a Concepção Materialista e Dialética da História.


Esta disciplina é, praticamente, a reprodução do caminho que percorremos com José Claudinei Lombardi durante os cursos Leitura das obras de Marx e Engels, e Leituras Marxistas, desenvolvidas no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Campinas, entre os anos de 2003 e 2007. Mais que isto, as leituras delimitadas foram por ele selecionadas a partir do curso original que adaptei e encaminhei por email para a sua avaliação. O conjunto dos ensinamentos expressos pelo Prof. Zezo, estão sistematizados em obras que vão nos orientar neste curso. A Tese de Livre-docência Reflexões sobre educação e ensino na obra de Marx e Engels, do próprio Lombardi; a primeira parte do livro Marx, Gramsci e o Conhecimento, de Marcos Francisco Martins. A tese de livre-docência também está disponível em livro, estando uma parte dela nesta disciplina, no instante em que vamos estudar a Crítica da educação e do ensino e outra parte em EBOOK, Embates marxistas: apontamentos sobre a pós-modernidade e a crise terminal do capitalismo.


Mas há movimento e mudança no modo como fazemos a história. Entre 2007 e 2014, o exercício de por os pés no chão, na história real, via militância no trabalho educativo e no movimento docente, trouxe aprendizados importantes sobre as relações de produção capitalistas, a luta de classes entre capital e trabalho, correlação de forças no enfrentamento do capital e das diferentes concepções internas ao movimento docente sobre a melhor direção na condução das lutas. Urge que façamos o movimento de análise daquilo que é o capitalismo hoje, e das possibilidades que a correlação de forças abre para a efetivação do projeto histórico de superação do capitalismo. Urge que dominemos o cerne do marxismo clássico.


Em 2014 obtive bolsa de Pós-Doutoramento da CAPES, e a oportunidade de distanciamento da inserção no trabalho educativo e no movimento docente. Empreendo estudos sobre o Idealismo Alemão (especialmente, Kant e Hegel), e a ontologia e gnosiologia materialista e dialética marxianas (obras do Marx e Engels e do Prof. Barata-Moura). Enfrento em trabalho ainda inconcluso o da possibilidade do conhecimento, intervenção e transformação da realidade, investigando com mais atenção a perspectiva da prática como critério de verdade em que nos ajuda? Em que nos confunde?


Por fim, cabe indicar que esta disciplina compõe as atividades de estudos e pesquisas empreendidas no projeto Pressupostos ontológicos, gnosiológicos e axiológicos da concepção materialista e dialética da história: contribuições para o trabalho pedagógico, a formação dos professores, a produção do conhecimento e as políticas públicas em educação e educação física, esportes e lazer, que vinha sendo desenvolvido no interior do PPG em Educação, na Linha Educação, Cultura Corporal e Lazer, e no Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Física & Esporte e Lazer. A partir de 2013/2014/2015, o fazer história determinado pelas condições legadas pelo passado nos movimenta para a fundação de um novo grupo de estudos e pesquisa: Marxismo e Políticas de Trabalho e Educação.


Indicadas as determinações que regem o modo como estamos desenvolvendo esta disciplina, cabe, agora, pontuar: (a) as obras com as quais vamos trabalhar e (b) o eixo que vai nortear o modo como vamos estudar estas obras.


O programa de leituras delimitado e a direção do estudo:


O curso está dividido em 02 partes.

Na primeira e maior parte, estudamos na fonte os pressupostos ontológicos, gnosiológicos, teleológicos e axiológicos que norteiam a concepção materialista e dialética da história.Na segunda parte, passamos a estudar com mais atenção o modo como o marxismo vai fazer a crítica da educação e do ensino próprias do capitalismo e como vai desenvolver os rudimentos de uma educação voltada aos interesse da classe trabalhadora.


Na primeira parte, vamos trabalhar com os Manuscritos Econômico-Filosóficos, de Marx, com A ideologia alemã, escrita por Marx e Engels, com o Manifesto do Partido Comunista, de Marx e Engels; com um extrato dos Grundrisse, publicado por Marx como Contribuição à Crítica da Economia Política, com as obras de Engels Anti Duhring, Dialética da Natureza, Do socialismo utópico ao socialismo científico e Ludwig Feuerbach e o fim da filosofia clássica alemã, e com a obra de Lenin Materialismo e empiriocriticismo, buscando: (a) os pressupostos básicos da Concepção Materialista e Dialética da História enquanto teoria do conhecimento que porta uma concepção do que é o homem e como ele apreende e age no mundo; (b) a compreensão do modo como o marxismo explica a relação da produção da existência com a produção e a transmissão do conhecimento; (c) a explicação que Engels oferece sobre as condições históricas e os processos que permitiram a produção da Concepção Materialista e Dialética da História.


Na segunda parte, passamos ao estudo mais detido, a partir de comentaristas, do modo como Marx e Engels vão fazer a crítica da educação e do ensino no capitalismo e como vão ser produzidos os rudimentos de uma educação voltada para os interesses revolucionários da classe trabalhadora. Trabalhamos, então, com a seleção de textos de Roger Dangeville, enfocando, especificamente, a questão da educação e do ensino na obra de Marx e Engels.


Questões norteadoras para as leituras:


Na incursão pelas obras de Marx e Engels, seguiremos orientados pelo seguinte conjunto de questões:


- Em qual conjuntura e qual o processo histórico que possibilita a Marx e a Engels desenvolverem a Concepção Materialista e Dialética da História? Qual teoria do conhecimento decorre deste movimento teórico e quais as implicações objetivas desta teoria do conhecimento para a apreensão da realidade? Qual a realidade que se apresenta neste processo? Quais as implicações específicas para a educação?


- Quais os pressupostos ontológicos, gnosiológicos, teleológicos e axiológicos que vão se estruturando a partir dos estudos, da intervenção prática e da crítica que Marx e Engels vão desenvolvendo “a tudo o que há” e como se articulam teoricamente estes pressupostos?


- Quais as possibilidades e limites do trabalho educativo?

O objetivo da avaliação é apreender o quanto o processo de trabalho pedagógico permitiu cumprir os objetivos propostos para a disciplina: a apropriação dos princípios da concepção materialista e dialética da história como decorrência das demandas conjunturais do século XIX.


A disciplina vai exigir dos estudantes uma carga de leituras razoável que ultrapassa as leituras indicadas para cada aula.


Nossa meta é reconhecer o marxismo pelas mãos dos seus fundadores, acompanhando as questões que os estão movimentando, e, neste processo, as respostas que vão elaborando para os grandes debates colocados, mas, mais que tudo, apreendendo que a teoria não foi desenvolvida pela teoria em si mesma, mas pela necessidade objetiva assumida subjetivamente de apreender o tempo e as possibilidades de ação que nele estavam colocadas.


Para Marx e Engels o século XIX apresenta-se, pela primeira vez na história da humanidade, como uma janela aberta pelo desenvolvimento das forças produtivas e, a partir delas, das relações de produção, para a produção de um novo modo de produção da existência na qual a humanidade, superando a sua pré-história, passa a gerir o seu futuro viabilizando de cada um conforme a sua capacidade, a cada um conforme a sua necessidade: o modo de produção comunista.


Programa e Cronograma de Leituras:


Unidade I: Concepção Materialista e Dialética da História

Aula 1 – Aula Inaugural – Apresentação do Programa do Curso e indicação das opções teórico-metodológicas norteadoras da proposta.

Aula 2 – 1843 – Marx – Crítica da filosofia do direito de Hegel;

Aula 3 – 1844 – Marx – A questão judaica;

Aula 4 – 1844 – Marx – O trabalho estranhado (Manuscritos);

Aula 5 – 1845 – Marx e Engels – A sagrada família;

Aula 6 – 1847 – Marx – A Miséria da Filosofia;

Aula 7 – 1846/1847 – Feuerbach – A ideologia Alemã;

Aula 8 – 1848 – Marx e Engels – Manifesto do Partido Comunista

Aula 9 – 1859 – Marx – Contribuição à Crítica da Economia Política – Prefácio e capítulo sobre o Método da Economia Política;

Aula 10 – 1867 – Marx – O capital (Prefácios; Capítulo 1; Capítulo 5; Capítulo VIII; Capítulo XI; Capítulo XII; Capítulo XIII; Capítulo XXIV).

Aula 11 – 1867 – Marx – O capital (Prefácios; Capítulo 1; Capítulo 5; Capítulo VIII; Capítulo XI; Capítulo XII; Capítulo XIII; Capítulo XXIV).

Aula 12 – 1877 – Engels – Anti Duhring;

Aula 13 – 1878-1882 – Engels – Dialética da Natureza;

Aula 14 – 1880 – Engels – Do socialismo utópico ao socialismo científico;

Aula 15 – 1886 – Engels – Ludwig Feuerbach e o fim da filosofia clássica alemã;

Aula 16 – 1908 – Lenin – Materialismo e Empiriocriticismo;


Unidade II: A teoria Pedagógica que decorre da Concepção Materialista e Dialética da História

a. A crítica da educação e do ensino;

Aula 17 – s/d – Dangeville – Crítica da Educação e do Ensino;


Referências Bibliográficas:

BARATA-MOURA, J. Uma introdução a Zur Judenfrage de Karl Marx. In: MARX, K. Para a questão judaica. Lisboa, Pt: Avante!, 1997.

DANGEVILLE, Roger. Marx e Engels: Crítica da Educação e do ensino. Editora Moraes: s/i, s/d.

ENGELS, F. A ideologia alemã. São Paulo: Boitempo, 2007.

ENGELS, F. A Origem da família, da propriedade privada e do Estado. São Paulo: Expressão Popular, 2010.

ENGELS, F. A situação da classe trabalhadora na Inglaterra. São Paulo: Boitempo, 2008.

ENGELS, F. Anti-Duhring. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

ENGELS, F. Dialética da natureza. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

ENGELS, F. Ludwig Feuerbach e o fim da filosofia clássica alemã. São Paulo: Alfa Omega, s/d.

ENGELS, F. Origem da família, da propriedade privada e do Estado. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995.

LENIN, V. I. Materialismo e empiriocriticismo. São Paulo: Mandacaru, 1990.

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[1] Os intelectuais tomavam ciência da realidade produzida com a revolução burguesa. Victor Hugo escreve Os miseráveis (1862). Jules Michelet escreve O povo (1845).

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